domingo, 29 de julho de 2007

Xailes e guitarras portuguesas


As fadistas tinham xaile,
e os outros tinham guitarras
(uma delas era portuguesa)
e depois começaram as palmas
e os gritos a pedir mais, a elogiar, a mandar piropos…

Veio a fadista da terra
(sorridente, entre amigos)
e depois aquele que também canta ao desafio

Houve fado vadio (como eu gosto)
mas também houve fado do fado
fado da saudade
fado cá de dentro,
fado sem palmas,
fado sem brilho, só com brio
Porque até ouve lagrimas (algumas minhas)

Depois ainda veio a que era "cabeça de cartaz"
aquela que invocou a Diva três vezes
e que cantava de olhos fechados
buscava lá no fundo as notas
que atirava ao público como melodias brutas

E por fim veio o que vive na terra
mas ninguém sabia que cantava
(e cantava bem)
o que fez uma festinha na cara da minha mãe,
enquanto cantava "Minha mãe mora no céu"
e gritou, em fado, contra as injustiças da vida… do fado.

Nesta noite... entre fados...
(vi) O sorriso feliz da minha mãe
(ouvi) As letras que me sabiam a lições de vida e (ao) o som da guitarra
(suspirei) A palavra que me lembra tudo o que respiro
(apreciei) Os xailes, acho que me envolvi neles para aquecer a alma

(decorei) Frases que vão ficar bem no artigo desta edição
(descobri) Quero uma casa portuguesa (embora dispense um ou outro elemento de decoração)
No fim... ouvi gritar: "Ser fadista é ser português"
E fechei os olhos em alguns momentos para... desfrutar e acalmar o fado dentro de mim
E dei descanso ao cansaço, descanso à rotina, e descanso à fuga de sempre, através de outra fuga.
...
Noite de Fados // Junta de Freguesia de Guifões // Matosinhos // Sabado, 28 de Julho/07
...
FOTO: Amigo guitarrista na tasta do costume - Guimarães - 15.07.05

Um fado para esta noite

Anda deitar-te,
fiz a cama de lavado
Cheira a alfazema,
o meu lençol de linhado
Pus almofadas com fitas de cor,
Colcha de chita com barras de flor
E à cabeceira, tenho um santo alumiado
Volta esta noite pra mim,
Volta esta noite pra mim,

Canto-te um fado,
no silêncio, se quiseres
Mando recado ao luar,
que se costuma deitar
Ao nosso lado,
pra não vir hoje, se tu vieres
Ponho o meu xaile,
pra te servir de coberta
E um solitário ao pé da janela aberta
Pus duas rosas que estão a atirar
Beijos vermelhos,
sem boca para os dar
Sem o teu corpo,
minha noite está deserta
Volta esta noite pra mim,
Volta esta noite pra mim
Ser agarrada,
por teus braços atrevidos
Quero o teu cheiro sadio,
neste meu quarto vazio,
De madrugada,
beijo os teus lábios adormecidos
Mando recado ao luar, que se costuma deitar,
Ao nosso lado, pra não vir hoje, se tu vieres


Música e letra: Fernanda Batista

Povo que lavas no rio

Povo que lavas no rio
E talhas com o teu machado
As tábuas do meu caixão.
Pode haver quem te defenda
Quem compre o teu chão sagrado
Mas a tua vida não.
Fui ter à mesa redonda
Bebi em malga que me esconde
O beijo de mão em mão.
Era o vinho que me deste
A água pura, puro agreste
Mas a tua vida não.
Aromas de luz e de lama
Dormi com eles na cama
Tive a mesma condição.
Povo, povo, eu te pertenço
Deste-me alturas de incenso,
Mas a tua vida não.
Povo que lavas no rio
E talhas com o teu machado
As tábuas do meu caixão.
Pode haver quem te defenda
Quem compre o teu chão sagrado
Mas a tua vida não.

Música: Fado Victoria
Letra: Pedro Homem de Melo

Uma casa portuguesa

Numa casa portuguesa fica bem
pão e vinho sobre a mesa.
Quando à porta humildemente bate alguém,
senta-se à mesa co'a gente.
Fica bem essa fraqueza, fica bem,
que o povo nunca a desmente.
A alegria da pobreza
está nesta grande riquezade dar, e ficar contente.
Quatro paredes caiadas,
um cheirinho à alecrim,
um cacho de uvas doiradas,
duas rosas num jardim,
um São José de azulejo
sob um sol de primavera,
uma promessa de beijos
dois braços à minha espera...
É uma casa portuguesa, com certeza!
É, com certeza, uma casa portuguesa!
No conforto pobrezinho do meu lar,
há fartura de carinho.
A cortina da janela e o luar,
mais o sol que gosta dela...
Basta pouco, poucochinho p'ra alegrar
uma existência singela...
É só amor, pão e vinho
e um caldo verde, verdinho
a fumegar na tigela.
Quatro paredes caiadas,
um cheirinho à alecrim,
um cacho de uvas doiradas,
duas rosas num jardim,
um São José de azulejo
sob um sol de primavera,
uma promessa de beijos
dois braços à minha espera...
É uma casa portuguesa, com certeza!
É, com certeza, uma casa portuguesa!

Música: V. M. Sequeira; Artur Fonseca
Letra: Reinaldo Ferreira

Nem às paredes confesso

Não queiras gostar de mim
Sem que eu te peça,
Nem me dês nada que ao fim
Eu não mereça
Vê se me deitas depois
Culpas no rosto
Eu sou sincera
Porque não quero
Dar-te um desgosto
De quem eu gosto

nem às paredes confesso
E nem aposto
Que não gosto de ninguém
Podes rogar
Podes chorar
Podes sorrir também
De quem eu gosto
Nem às paredes confesso.
Quem sabe se te esqueci

Ou se te quero
Quem sabe até se é por ti
que eu tanto espero.
Se gosto ou não afinal
Isso é comigo,
Mesmo que penses
Que me convences
Nada te digo.

Música: Ferrer Trindade, Artur Ribeiro
Letra: Maximiano de Sousa
Intérprete: Amália Rodrigues

terça-feira, 24 de julho de 2007

Chama-se esperar

Depois de ter visto (porque sim) na ultima vez que fui ao cinema a apresentação do filme que demorou vinte anos "a fazer", depois de 18 temporadas e 400 episódios, e mesmo lutando contra mim própria, porque não gosto de lhes chamar "a família mais divertida da televisão" – continuo fiel aos "Flinstones" – depois de um artigo na "Visão" que faz a ronda pelo intelecto de cada um dos amarelinhos, e de hoje (ontem à hora de almoço) ter trocado mil coisas importantes para fazer por uma página do "Público" com testemunhos e descrições sobre a antestreia do filme em Springfield, depois de ter dado por mim a procurar fotos do Homer, da Lisa, do Bart, da Marge, e da minha preferida a Maggie, na net às duas da manhã… e depois de não me terem enviado mensagem a confirmar as minhas mil tentativas de ganhar bilhetes para a antestreia em Portugal (quarta-feira à noite estarei totalmente "amarela" de raiva de quem me disser que conseguiu), enfim… acho que a isto se chama esperar por alguma coisa.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

O Meu Amor Existe (mestre)

O meu amor tem lábios de silêncio
E mãos de bailarina
E voa como o vento
E abraça-me onde a solidão termina

O meu amor tem trinta mil cavalos
A galopar no peito
E um sorriso só dela
Que nasce quando a seu lado eu me deito

O meu amor ensinou-me a chegar
Sedento de ternura
Sarou as minhas feridas
E pôs-me a salvo para além da loucura.

O meu amor ensinou-me a partir
Nalguma noite triste
Mas antes, ensinou-me
A não esquecer que o meu amor existe.

JORGE PALMA

O Meu Amor Existe (nós)

Às vezes dou por mim, na ausência sem distância, a tomar forma na cama. A forma que sei ser das sensações boas de embalo partilhado (e que agora sei serem também das pequenas explosões). Perna para cima, leve rodar de cabeça na procura do olfacto de sempre, o ouvido também procura sentir que “estás vivo”, a há bocas que se cruzam entre sonhos, aliás nem sei se a sonhar ou acordada, trocam-se sabores, e novo fôlego para o resto daquela que é mesmo a melhor conselheira, e neste caso, a melhor cúmplice das certezas, das mais verdadeiras (sempre leal, sem inventar desculpas). Às vezes dou por mim a entrelaçar-me em mim própria, e a mimar um corpo que já não é meu, por ser nosso, por exigir prolongar-se. Os dedos até percorrem as curvas e os olhos piscam, cientes que nunca estão sozinhos, felizes adormecem numa paz escura iluminada. Nessas noites tenho a certeza que sorrio, mesmo sem ter ninguém que me confirme, sei, senti a certeza espontânea do corpo que procurou e sentiu, a certeza verdadeira, leal. Às vezes dou por mim a pensar sem saber se estou desperta, e outras a querer abandonar os pensamentos para poder agarrar os sonhos inconscientes e sentir que não há mesmo distância. Às vezes e sempre, entre saudades que querem dizer-me o contrario, o corpo também me dá sinais, os gestos também me dão as dicas, e não há ausência.

Nestes dias, nestas noites, no que se segue, fico/ficarei feliz por dar por mim às vezes… Sempre!

Bons dias e noites (madrugadas) que se seguem M U N D O

FOTO: nossa em nossa casa da nossa cidade (Junho/07)

domingo, 15 de julho de 2007

Reflexos


(saber/merecer) AGARRAR

sexta-feira, 13 de julho de 2007

U N O S

*A magia de ser só um... o céu como limite*

Acho que foi inventada para nós
Pensar que te encontrei
Pensar que sempre te conheci
Pensar em nós
Pensar na vida
Pensar nos planos
Pensar no presente
Pensar no que vamos fazer
Pensar que só quero estar
Pensar que quero tudo
Pensar que tenho tudo
Pensar que sou feliz
Pensar em fugir
Pensar em ficar
Pensar que somos
Pensar que sentimos
Pensar igual
Pensar que inventaram uma palavra para nós
Pensar nesta sensação inédita
Pensar em todo o lado
Pensar sempre
Pensar
Pensar que pensar
Pensar que a palavra “pensar” deixou de ter sentido
Pensar porque sinto/sentes/sentimos
Pensar a um ritmo alucinante
Pensar entre mil suspiros
Pensar entre mil sorrisos
Pensar em milhões de saudades
Pensar tranquilamente
Pensar desfrutando dos pensamentos
Pensar saboreando cada pensamento
Acho que foi inventada para nós
...
FOTO: de Bruxelas para o Mundo (Maio/07)

quinta-feira, 12 de julho de 2007

O mestre... ao calhas... para ti


"…levo as asas nos bolsos
e o coração a planar
são sempre os mesmos
ossos que eu insisto em partir
a madrugada vem ai
longe das ilusões
e o presente é uma réstia de esperança enquanto houver saúde
entre o amor e as razões perversas
é tão bom ver-te assim, ardente
a cinquenta e tal graus
cá estamos nós outra vez
encosta-te a mim
o que não vivi, hei-de inventar contigo
recebe esta pomba que não está armadilhada
nunca deixes de acordar
entre o chill-out e o transe
a sinfonia dos gritos
é tão bom ver-te voar
eu disse: vamos partir, o espaço é seco, vazio, banal, vamos fugir!
andamos de lugar em lugar
com erva, vento, pedra e frio, na montanha ou no rio
merecem ternura e atenção
vou ficar a ver-te mudo
gritando slogans na rua
a mais chique maravilha
quando tomares a Bastilha
há-de lá chegar, hum, há-de lá chegar
com toda a certeza, há-de lá chegar!
Vive! Dança!
não percas tempo a tentar ser feliz…"

Excertos: "Voo Nocturno" de Jorge Palma
FOTO: Sé de Lisboa (Junho/07)

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Depois do voo nocturno e sempre a voar


Encosta-te a mim, nós já vivemos cem mil anos
encosta-te a mim, talvez eu esteja a exagerar
encosta-te a mim, dá cabo dos teus desenganos
não queiras ver quem eu não sou, deixa-me chegar

Chegado da guerra, fiz tudo p´ra sobreviver
em nome da terra, no fundo p´ra te merecer
recebe-me bem, não desencantes os meus passos
faz de mim o teu herói, não quero adormecer

Tudo o que eu vi, estou a partilhar contigo
o que não vivi, hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim

Encosta-te a mim, desatinamos tantas vezes
vizinha de mim, deixa ser meu o teu quintal
recebe esta pomba que não está armadilhada
foi comprada, foi roubada, seja como for

Eu venho do nada porque arrasei o que não quis
em nome da estrada onde só quero ser feliz
enrosca-te a mim, vai desarmar a flor queimada
vai beijar o homem-bomba, quero adormecer

Tudo o que eu vi, estou a partilhar contigo
o que não vivi, um dia hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim



JORGE PALMA
Voo Nocturno


O mundo... a vida... e a confiança nas histórias de principes e princesas, afinal existe um feiticeiro, qual mestre... só magia, há sempre magia, daquela sábia.

Era noite...


As luzes foram-se apagando uma a uma. Restavam duas, uma contagiante ainda que vista e imaginada de lado, outra vista ou imaginada através dos buraquinhos das persianas semi-fechadas.
Ainda assim sentia-se vida, até porque o sono, ou as insónias imaginadas, também são vida.
Algumas estrelas. Não se encontrava a brilhante, companheira de sempre, mas viam-se, contavam-se estrelas e o céu estava limpo. Confiança. O dia, o dia seguinte, teria bom tempo. A vida continua com bom tempo.
Arvores serenas, num espaço relvado sem utilidade. Sem a utilidade que deve ter um espaço com relva.
A natureza parada para que se pudesse contemplar, entre os buraquinhos da vida que se iam apagando um a um, que a natureza, essa humana, continuava dentro. Essa que não é pública, é tão íntima, provavelmente ou esperançadamente, tão verdadeira.
Pensar em luz lembra cidade. Lembra vida, e a cidade que se lembra, pela luz, tinha vida, tanta vida. Vida pública, vida íntima, vida partilhada, vida boa, vida!
De uma porta para outra, passou, atravessou o relvado inútil, indiferente, sem saber, por não saber, que estava a ser acompanhado. E acendeu-se outra luz, esta era do outro lado e era forte. Imaginada, parecia vida. Esperava-se que fosse aliás.
Alguns, os resistentes, ainda se ouviam em baixo, à esquina. Esses também desconheciam que alguém lhes seguia as vozes, dormente demais para poder, querer ouvir as conversas.
E as estrelas permaneciam. As arvores serenas. A cidade onde tinha sido deixada. A vida continuava. A contemplação resultava em serenidade.
Era noite, mas existia luz e existia vida.