domingo, 13 de julho de 2008

"A girafa que comia estrelas" (3)

(…)

Um dia, porém, descobriu uma galinha-do-mato que fizera ninho no meio das nuvens.
O ninho estava cheio de objectos brilhantes que a galinha trouxera da terra – três pares de óculos, oito berlindes coloridos, um colar de pérolas, um arco-íris de bolso, um olho de vidro que havia pertencido (dizia ala) ao famoso pirata da perna de pau.

As galinhas-do-mato são muito bonitas, todas pretas com pintinhas brancas, e por isso também lhes chamam galinhas pintadas.
Aquela pareceu a Olímpia ainda mais bonita de que as restantes.
As penas dela brilhavam com luz própria, como se pelo facto de viver tão alto tivesse adquirido um pouco do fulgor do sol.

“Olha lá”, perguntou-lhe Olímpia, admirada, “tu és um anjo?”
Não, era apenas um galinha que gostava de viver nas nuvens. Chamava-se Dona Margarida.

Não era muito inteligente, coitada, mas gostava de pensar.
Pensava, pensava e depois dizia coisas óbvias que já toda a gente sabia, como se ela mesmo as tivesse inventado.
Por exemplo:

“Quem tudo quer tudo perde.”
“Devagar se vai ao longe.”
“Nem tudo o que reluz é oiro.”
Etc. Dizia estas coisas piscando os olhinhos e torcendo a cabeça. Via-se que fazia muita força para pensar.

“E anjos”, insistiu Olímpia, “nunca viste anjos nas nuvens?”
Não, nunca vira.
Mas podia ser que os houvesse. Por vezes ouvia vozes, macias e remotas, vindas de nuvens mais altas e plumas enormes, que não se pareciam com as de uma ave que ela conhecia, caíam lá de cima nas tardes de vento.

(…)

JOSÉ EDUARDO AGUALUSA

Falta mesmo pouquinho tempo, pequena estrela. Sabes, já temos muitos desenvolvimentos… És uma estrelinha menino… O pai e a mãe já escolheram um nome… O avô anda muito feliz e conta a toda a gente que existe a nossa estrelinha e a avó continua a fazer muitos casaquinhos e sapatinhos de cores diferentes e muito bonitos. E tens um quartinho que os tios e a avó ajudaram a montar com um berço que tem ursinhos. E vais ser a estrelinha brilhante da tia, mas tens de te portar bem e deixar a mãe descansar porque dormir quentinho é muito bom e assim podes aproveitar tudinho até ao fim porque já só falta um bocadinho. Ate já pequena estrela… A tia continua a dar-te as boas-vindas assim e nunca se vai esquecer das histórias. Vamos piscar os olhinhos enquanto vemos as nuvens e sentimos o sol?

...

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Frio

Daqui conseguimos ouvir os pássaros.
(disse ela)
Sim. E sentimos o perfume das árvores e o friozinho da pedra.
(respondeu-lhe)
Gostava de ter vivido naquele tempo.
(desabafou)
E viveste. Vivemos, aliás.
(completou)
Sim. E vivemos bem não foi?
(ela, sobretudo ali, tinha medo)
Muito bem, como sempre.
(sossegou-a)
Tens vertigens?
(perguntou, para completar a certeza)
Não. Aqui não. Agora não.
(certeza completa)
E gostas de ouvir os pássaros?
(ela precisava de mais)
Consigo sentir o friozinho da pedra. E gosto dos teus pássaros.
(deu-lhe só um pouco mais)
Sinto o friozinho também. Mas os pássaros e as árvores…
(aproveitou)
Sim. Eu sei…
(disse ele)

FOTO: uma Varanda do Castelo_Berço da Nacionalidade