sábado, 7 de abril de 2007

Maçazinhas (viva o romantismo!)

As varandas

As lanças

As damas

“São elas as destinatárias de todos os comportamentos folclóricos, tão tipicamente masculinos, ostentados em todos os outros Números”. É assim que os Velhos Nicolinos explicam o número das Nicolinas – Maçãzinhas (6 de Dezembro, dia de S. Nicolau).
As raparigas, que antes eram impedidas de participar nas festas, têm o papel principal, são as “princesas”, recolhem o fruto proibido e, com amor no olhar, oferecem aos rapazes as prendinhas, símbolo da reciprocidade do sentimento.
Como se fosse possível demonstrar com o que é material, o que se sente…
As meninas estão, simbolicamente, nas janelas ou varandas. Capas negras, camélias brancas, olhares brilhantes, corações aos pulos, inseguranças, lanças apontadas aquela ou à outra… as Maçãzinhas…
Este é o número de maior e mais clara inspiração romântica, de recuperação das antigas técnicas de galanteio, cuja particularidade se prende com o facto de apesar de, nos dias de hoje estarem já ultrapassadas, conseguirem ainda manter os seus efeitos de romantismo.
Porque é que se chama ao número “Maçãzinhas”?
Versão oficial: “o nome deste número nicolino advém precisamente do facto de as maçãs que servem de oferenda, serem muito pequenas em tamanho. Isto porque, as primeiras maçãzinhas que os estudantes levavam eram oferecidas, e foram-no durante muitos anos (até 1838), pelo Rendeiro de Urgeses que oferecia sempre maçãs redondinhas, coradinhas e muito pequeninas”.
Mas a magia das Maçãzinhas começa muito antes do dia 6 de Dezembro. Desde logo os rapazes têm que levar a sua lança, a lança que colocam no cimo da cana com que chegam às varandas, carregada de fitas que pedem às raparigas. Fitas que podem ser de várias cores e cada uma tem o seu significado.
“Fulano pediu-me uma fita bordada” (ouve-se, ou ouvia-se, pelas ruas estreitinhas do burgo de Guimarães). Nas fitas, para além das cores escolhidas, são colocados dizeres, símbolos e mensagens que deixam “pistas” aos rapazes sobre qual a rapariga em que deverão “apostar” para apontar a lança e oferecer a maça. Se os rapazes já tiverem optado por uma rapariga que pretendem galantear, pedem-lhe a fita do laço, que tem o dobro do tamanho das restantes, sempre cor-de-rosa. No entanto, a fita do laço das primeiras Maçãzinhas de um rapaz é sempre, por tradição, oferecida pela mãe sendo, nesse caso, sempre, branca.
No dia 6 de Dezembro, as Maçãzinhas consistem num cortejo alegórico, que desfila pelas ruas da cidade, com saída às 15h00, tendo como destino final a Praça de Santiago (antigamente era o Largo do Toural e Rua de Santo António, mas por imposição dos tempos, fundamentalmente devido ao trânsito, foi alterado o destino para uma das mais simbólicas praças da cidade de Guimarães). Local que apesar de não ter nenhuma ligação directa à festa nicolina, tem o mesmo nome da cidade espanhola (Santiago de Compostela), que teve muita importância na introdução do culto a S. Nicolau em Guimarães. Será de certa forma, de forma inconsciente, a maneira encontrada de prestar homenagem aos romeiros? A Santiago? À mística? Que união é esta entre tradição, cidades, vontades, encantamento?
Manhã: preparativos para a festa.
Eles: nas Oficinas de S. José, constroem e ornamentam os carros, preparam os disfarces, colocam as fitas nas lanças, colocam as lanças na respectiva cana, arranjam um Escudeiro que os acompanhe.
Elas: na Praça de Santiago, cosem camélias brancas às capas negras de estudante, colocam as capas nas varandas, ocupam as varandas, esperam…
O desfile: liderado pelo 1º Vogal da Academia, a cavalo, seguindo-se o coche do chamado “Carro dos 4” (composto pelos membros da Comissão de Festas que ocupam os cargos da Academia - presidente; vice-presidente; tesoureiro e secretário), trajados a rigor, de capa e batina. Seguem-se os carros alegóricos com os restantes membros da Comissão e todos os estudantes disfarçados. Cada carro alegórico está subordinado a um tema.
Disfarces: uma forma de evitar identificações. Os envergonhados, os atiradiços, os matreiros, os timidos... todos com a sua pretendida.
Na Praça de Santiago, normalmente preenchida de populares, as meninas aguardam pacientemente e dá-se início à magia… As canas vigorosamente levantadas por eles com as maçãs (para quem será a mais rosadinha?) A felicidade esboçada por elas (“fui a escolhida”) é, simbolicamente, retribuída com a colocação de uma “prendinha” na ponta da lança (quem será o felizardo que terá a prenda melhor?).
Resta, no final, retirar a lança da ponta da cana e oferece-la àquela a quem o rapaz se pretende declarar (ou à mãe).
Chamar a este número, no presente, recuperação do namoro “à moda antiga”, é pouco para quem o vive. Qual faltar às aulas com falta justificada? É ser de Guimarães? É ser Nicolino, sem ser?
Fazer parte da memória, ansiar e desejar…
Hoje, as Maçãzinhas, percebe quem vê, sente quem participa, é a hipótese que a cidade, os costumes, a modernidade, a total liberdade dos relacionamentos, nos dá de perpetuar o galanteio.
Viva o romantismo!

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