sexta-feira, 8 de outubro de 2010

(ainda) incompleto


“Embalo” foi o nome dado à música. “Embalo” é o nome dado ao acto de “embalar”. Embalar-me-á este estado de alma, este estado de madrugada, este estado de ser e não ser ao mesmo tempo. Embalar-me-á? Podia muito bem começar este “embalo” com uma canção de embalo. Esteve em estado de “embalo” durante semanas o acto em si. E o mote, de embalo, atreveu-se agora a tomar vida. Com A “Canção de Embalar”.
Dizem que “não há festa como esta”. Dizem apaixonadamente. Diziam-me que me apaixonaria também. Disseram-me apaixonados. E demorou. E cumpriu-se. E o acto em si, a reflexão demora, mas cumpre-se. Devagarinho!
“Descoberta” foi o estado de alma transportado para o recinto (grande demais. exageradamente grande) “Liberdade” foi o estado de madrugada recolhido. E ter de regressar à realidade? E ter de voltar a suportar o “peso” da reflexão vagarosa. Contraditório porque não existe, à partida, peso no embalo.
E descobriu-se o sr. Zé que esteve preso quatro anos por fazer um jornal clandestino. E bandeiras com listas (algumas negras) que não escondem o sotaque galego. E descobriu-se a força das mensagens e a força, também é verdade, dos carimbos e dos rótulos. Tantos, a maioria talvez, rótulos orais. Formas simples, à primeira vista, de chamar e cumprimentar. Formas pesadas e complexas, se pensadas, reflectidas. E descobriu-se um livro que falava de sede e de água a jorrar da boca. E tantos discos antigos, colecções, horas que foram pequenas, segundos que pareceram eternidades. O sr. Zé fez da vida uma batalha. Uma batalha ao sabor dos caracteres que ia colocando na sua máquina, mãos cheias de tinta, óculos embaciados de emoção nas linhas que contava, folhas de papel… Folhas de “embalo”. E descobriu-se que há lugar para o folclore e para o jazz e lugar para molhar os pés em dia de muito, muito, muito calor. Às tantas, descobriu-se um jacto de ar fresco novo. Diferente. Descobriu-se depois do sr. Zé e depois da interiorização dos rótulos e depois do livro sobre a sede. Antes dos apontamentos e durante a interiorização das mensagens.
Embalou a primeira madrugada. Tudo a perder? Tudo a ganhar? Tudo a descobrir? Liberdade afinal? Embalou a segunda… Essa mais galega. Perdeu-se muito, mas descobriu-se tanto, sobretudo nas mãos cheias de tinta de um sr. de 70 anos que fazia um jornal, outrora clandestino, com a calma sábia de quem tem convicção da batalha e dá o peito à luta. O embalo do regresso… Dar também o peito à luta. Mas foi de “Liberdade” e não de “Descoberta” que se desenhou o “embalo”, num estado de alma de ser e ser tão pouco ao mesmo tempo, do regresso. Depois daqueles segundos que pareceram a eternidade toda e antes do jacto de ar fresco. Novo. Pesado. E a sede? E o nome que se deu à música? Tinta a mais nas mãos...
Dorme meu menino a estrela d'alva / Já a procurei e não a vi / Se ela não vier de madrugada / Outra que eu souber será p'ra ti / Outra que eu souber na noite escura / Sobre o teu sorriso de encantar / Ouvirás cantando nas alturas / Trovas e cantigas de embalar / Trovas e cantigas muito belas / Afina a garganta meu cantor / Quando a luz se apaga nas janelas / Perde a estrela d'alva o seu fulgor / Perde a estrela d'alva pequenina / Se outra não vier para a render / Dorme qu'inda a noite é uma menina /
Deixa-a vir também adormecer
Zeca Afonso
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