segunda-feira, 20 de outubro de 2008

CV (3)

*Cidade Velha, Ilha de Santiago, Cabo Verde*


Trocar dinheiro pela manhã. Tratar de expedientes como ouço Sori dizer. E ir ao mercado. Gosto de mercados. Tanta cor, tanta turbulência viva à volta de bancas confusas e animais em coro desregulado. Ir ao mercado na primeira manhã da Cidade da Praia, que conjugação perfeita realizada no meio de sons crioulos que, explicaram-me, são parecidos em substantivos e adjectivos – Sr. do telefone, o “D’já stá”, porque "o crioulo come letras aqui e acrescenta letras além”, o Toni, das fotos Toni – e só muda nos verbos.
O calor é convidativo. Transpirar é (apesar de puder parecer contraditório) uma lufada de ar fresco.
Vi o mar de Cabo Verde e a espuma foi-se apoderando da minha pele muito branca, sedenta de sol, sedenta de ar. A areia preta fez-me novas formas nos pés. São pegadas novas. Pensei!
E a simplicidade harmoniosa de ser convidada para almoçar. Casa do Hélder com a Joana (empregada de… há quantos anos? “Vida toda!”) e a mãe do Hélder, uma senhora que só podia ter uma família especial. Deram-me, com o coração mais aberto do mundo, feijão com arroz e chicharrinhos fritos daqueles que se come cabeça e tudo. Recebi com o coração agradecido de quem está na Cidade da Praia a comer uma das suas comidas preferidas, em família.
Depois ouvimos Sansa e a sua história sobre a fuga à droga, sobre a sua luta diária, sobre o seu renascimento. Ouvimos um bocadinho de Princesito – de quem a Mayra fala nos concertos – Lua… fica cu mi…
O vento que corre na estrada embala-me tanto quanto a conversa do Sori e do Hélder à frente a falar em crioulo.
Cegamos à Cidade Velha.
Uma Super Bock na esplanada da Cidade Velha, Ilha de Santiago, Cabo Verde.
E muita paz!
“Neste pelourinho eram chicoteados os escravos” – disseram-me.
Na Cidade Velha vi crianças a jogar à bola na rua. Gosto de meninos a correr na rua, ao ar, gosto de sorrisos rasgados.
E na Praia, também vi os meninos a sair das aulas de uniforme azul e branco já prontos para brincar na rua. Até parece que não há carros nas extensas ruas da “Moradia”. Extensas para os meninos de palmo e meio que acabam de sair do Liceu Domingos Ramos.
Estou a gostar de mim em Cabo Verde porque gosto de sorrisos rasgados e de corações abertos.

(Entretanto a Cat deve estar a chegar da senzala, vulgo "A Semana", e vamos trocar pormenores sobre este dia 9 de Outubro. Há um dia-a-dia entre nós, outra vez)

1 comentário:

Por: Catarina Abreu disse...

Tu da tua perspectiva, eu da minha. Não consegues imaginar como é maravilhoso ver o meu(agora nosso) Cabo Verde sob a teu olhar.. Como interpretas os pormenores, os lugares, os meus amigos, a música, o crioulo.. Uma realidade que era muito minha e que julgava que nesse lado do meu mundo ninguém compreendia. Agora que vieste cá, tu compreendeste (e viveste) também.